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8 de Maio de 2024

Coletivos universitários denunciam AfroConveniência em possíveis fraudes de cotas

Precisamos falar sobre cotas. Mas também precisamos falar sobre AfroConveniência.

Publicado por Camila Vaz
há 8 anos

Coletivos universitrios denunciam AfroConvenincia em possveis fraudes de cotas

Quer você seja a favor ou não, a lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, é clara: garante a reserva de 50% das matrículas por curso e turno nas 59 universidades federais e 38 institutos federais de educação, ciência e tecnologia, que serão destinadas a estudantes de ensino público, oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo e a autodeclarados pretos, pardos e indígenas.

De acordo com o Ministério da Educação (MEC), o critério de raça é autodeclaratório, "como ocorre no censo demográfico e em toda política de afirmação no Brasil. Já a renda familiar per capita terá de ser comprovada por documentação, com regras estabelecidas pela instituição e recomendação de documentos mínimos pelo MEC."

Ou seja, não há medidas que fiscalizem ou acompanhem a autodeclaração. O uso de bancas examinadoras , por exemplo, causou polêmicas no passado e foi abolido pelas instituições.

Diante desse contexto, coletivos negros de universidades brasileiras perceberam casos de oportunismo, ou ingenuidade, na utilização da autodeclaração e começaram a denunciar as #FraudesNasCotas e a #AfroConveniência. As hashtags e campanhas nas redes sociais ganharam fôlego após coletivos da UFES e da UFRB se posicionarem sobre o tema.

Entenda o caso

Mirts Sants é integrante do coletivo capixaba Negrada. Em entrevista ao HuffPost Brasil ela conta que a organização surgiu em 2012 devido as dificuldades de permanência dos estudantes negros na UFES. Em março, a entidade coletou cerca de 40 denúncias de possíveis cotistas fraudulentos e entregou os documentos ao MPF-ES, que arquivou o caso no âmbito criminal.

"As fraudes foram percebidas na UFES no ano passado, quando recebemos denúncias de pessoas que fraudaram nas cotas raciais e sociais. As denúncias foram recebidas, por escrito e pessoalmente, por estudantes negros e, principalmente, por brancos, que observaram que não-negros estavam ocupando as vagas não devidas."

As denúncias foram feitas com base nos perfis dos aprovados nas redes sociais. De acordo com os representantes do coletivo, os nomes listados não atendiam aos critérios necessários para se beneficiar das cotas no processo seletivo da UFES. Em entrevista ao jornal Gazeta, João Victor dos Santos reafirmou o argumento da denúncia:

“As fotos do Facebook deixam claro que eles não têm características de negros ou pardos, mas se declararam como tais. Muitos deles nós conhecemos pessoalmente e sabemos que não se incluem nas cotas."

No entanto, apesar do movimento iniciado pelo coletivo, o Ministério Público do ESarquivou, em âmbito criminal, o pedido de denúncia, segundo informações do G1.

De acordo com o MPF-ES, na lei que regula a política de cotas para ingresso nas universidades federais e no edital do Vestibular da UFES, consta apenas a autoidentificação como critério para que o candidato possa usufruir do sistema de cota racial e, segundo a decisão, não estão previstos, nem na lei, nem no edital,"quaisquer critérios fenotípicos, genotípicos e de qualquer outra natureza, para a identificação de pardos, negros ou índios (PPI)."Logo, para o orgão, é impossível falar na prática de falsidade ideológica.

Mirts Sants contesta a decisão do MP. Para ela, é papel das instituições criar mecanismo que impeçam a banalização da autodeclaração.

"Dois candidatos reconheceram e desistiram de continuar ocupando a vaga, porém, a maioria criticou a inexistência de mecanismo de controle e viram na autodeclaração abertura para continuar a fraude. O MP e as universidades devem coibir que a autodeclaração seja banalizada. Se está ocorrendo fraudes eles precisam apurar e criar mecanismos de controle. As fraudes na autodeclaração são conscientes e com a intenção de burlar uma lei. A Justiça tem que levar em conta o objetivo da lei, que é a inclusão de pretos, partos e indígenas, e advindo da escola pública no ensino superior. Se a autodeclaração falsa está inviabilizando a lei de reserva de vagas, temos um grande problema aí. O MP tem o dever de proteger o cumprimento da lei e não justificar a prática de crimes para benefícios individuais com o argumento de que há uma brecha na lei."

O coletivo Negrada conta com apoio jurídico da Comissão de Igualdade Racial da OAB-ES. Em nota oficial, a presidente da comissão Patrícia Santos da Silveira argumenta que só com a modificação da lei é que poderia existir a possibilidade de uma responsabilização por parte criminal e, inclusive, cível.

“A vantagem é que com este arquivamento na área criminal temos a chance de seguir para um órgão colegiado e é o que vamos tentar agora junto com o Coletivo Negrada, dando todo o suporte jurídico para que esse recurso seja feito.

Se existe um artigo dizendo que declaração falsa incorre em falsidade ideológica, como é possível ignorarmos isso? Tem um procedimento onde demonstra que algumas fotos não são de pessoas negras, então onde não existe fraude? Não posso me declarar branca, porque no primeiro momento qualquer pessoa dirá que sou negra, então qual é a diferenciação de olhar para alguém que é branco e dizer que é pardo? Isso não existe. A sensação é de que querem driblar a lei."

Na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, uma estudante do curso de Medicina contabilizou dez casos suspeitos de pessoas que se beneficiaram do sistema de cotas, segundo a Folha de S. Paulo.

Em entrevista ao jornal, a estudante disse que a fraude é foco do coletivo NegreX, do qual faz parte. Com cerca de 200 estudantes negros de medicina de várias universidades do país, o grupo organizado denuncia o que intitularam de "afroconveniência": pessoas que "se valem da subjetividade da autodeclaração para obter vantagens", como explica a universitária.

O que fazer?

A estudante e militante negra Maria* (preferiu não ser identificada) vê com cautela a proposta de revisão da lei de cotas, sugerida por alguns coletivos negros.

"Eu acho que é difícil falar em revisar a lei, pois poderíamos cair em um"julgamento colorista", embebido no racismo que embraquece os pretos. Ninguém seria preto. Para você ter uma ideia do poder desse embraquecimento, minha tia afirma de pé junto que eu sou branca e não negra - mas OLHA A MINHA MELANINA! Acho que o que deveria ocorrer é ter especialistas em colorismo para avaliar esses casos encaminhados ao MP. É evidente que há casos em que a pessoa não é negra, então a lei até poderia ser revista nesse sentindo: focar nos traços negroides da pessoa e não somente na autodeclaração.

Além disso, faz-se necessário o cumprimento da lei 10/639-03 que obriga o ensino e valorização da cultura negra na escolas. A discussão sobre racismo em sala de aula pode ajudar todo mundo, seja brancos ou negros a ser conscientes sobre a questão. Negros teriam mais base e força para se declarar negros e 'sinhôzinho sem noção' poderiam, talvez, criar um respeito maior pela nossa luta e história."

Pensando em possíveis soluções para o problema, o coletivo Negrex publicou uma carta em sua página do Facebook em que destaca 6 medidas que podem ser adotadas para combater às fraudes:

- Criação de uma instância permanente de apuração das denúncias de maneira ampla e rápida, principalmente nos casos das vagas raciais, em que caso se constate pessoa branca a se passar por negra ou indígena, seja automaticamente eliminada da concorrência dessas vagas e dê tempo hábil para aqueles que se enquadrem no perfil realmente possam concorrer entre seus iguais;

- A busca por servidores internos formados e capacitados na discussão das cotas e etnia-raça, para a averiguação de fraude nas cotas sócio-raciais;

- Publicização no Portal da UFRB da lista de todos (as) estudantes do PPQ-UFRB, organizados por centro de ensino, para a ciência de quem recebe o benefício e assim se tornar mais fácil a solicitação de verificação daqueles suspeitos de estarem fora do perfil e que possam estar fraudando;

- Judicializar todos os casos apurados e comprovados de fraude, com a cobrança da devolução imediata de todo o recurso recebido de maneira ilícita do PPQ e saída do programa;

- Da perda das vagas (jubilamento) dos que estão fora do perfil exigido das cotas sócio-raciais;

- Imediata apuração dos (as) candidatos (as) para as vagas raciais das terminalidades do BIS, em especial Medicina, onde se concentram os casos mais gritantes de fraude.

  • AfroConveniência

"Meu avô é branco. Logo, eu sou branco. Estranhou? #AfroConveniência."

Fonte: brasilpost

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28 Comentários

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Será que algum dia vamos nos ver livres do câncer populista e finalmente ver o investimento de novo no ensino público? Uma herança da ditadura que fazem questão de cultivar e fazer florescer ainda que não tenham coragem de assumir ... se o ensino público fosse de qualidade ninguém precisaria de cotas.

Se traçarmos uma linha do declínio da qualidade educacional, somarmos ao interesse de passar de ano a todo custo e a satisfação que isso gera, convertendo-se em apoio/votos de gratidão, veremos onde começou e onde estamos e porque.

A grande ameaça do ensino de qualidade é a formação de eleitores conscientes, que não se iludem com migalhas e nem com discursos esbravejantes ... e chamam isso de política social.

Nunca me esquecerei da cara de malandro de um jovem que concluíra o ensino fundamental e nem sabia escrever o próprio nome, que apareceu para ser atendido ... como ele conseguiu? Simples: uma política de ensino que não reprova alimentada por dinheiro público em troca de índices de aprovação ... vc dança carnaval, ganha pontos; dança São João, ganha pontos; joga futsal, ganha pontos ... tudo vale pontos, menos estudar. continuar lendo

Herança da Ditadura? Essa moçada que não consegue entrar por vias normais são do período democrático para cá, a educação na época do regime militar era mil vezes melhor que essa porcaria socialista que o governo democrático apresenta. continuar lendo

Parabéns pelo seu comentário Armpit Lover muito contributivo, espero que melhorem o ensino basico público. E o problema não está só no sistema, tem os laços familiares e da região onde vive que influência no comportamento de indivíduos que não estão nem aí. E os alunos que não querem estudar e atrapalham o reto da turma devem ser colocados todos numa mesma sala.e trabalhados de uma forma mais diferenciada. E passarem por analistas e assistentes sociais. Para solucionar o real problema de tais comportamentos. continuar lendo

Na época da ditadura o ensino tinha mais qualidade, mas a partir dela foi q piorou, sendo um declínio muito acentuado já no governo Sarney ... de lá pra cá é ladeira abaixo a 100km/h. continuar lendo

Prezado, não tem nada a ver com governo de ditadura. Quando estudei os antigos primário, ginásio e científico sempre foi em escolas públicas e, com 17 anos, fui aprovada em vestibular em faculdade pública federal, isso entre as décadas de 1960 a 1970. E em todas as etapas tive que fazer provas de admissão e não havia cota para nada. O ensino era excelente e tive professores muito competentes que não vou citar nomes agora para não esquecer ninguém. Os governos POPULISTAS com certeza são os maiores responsáveis pelo que vemos hoje: nossas escolas são de péssima qualidade e trágica manutenção, os professores são mal formados e mal pagos e resultou no que vemos por aí. Como você mesmo disse: "A grande ameaça do ensino de qualidade é a formação de eleitores conscientes...". E, pra completar, quando o nosso ensino é avaliado em âmbito internacional somos classificados quase no fim da fila. continuar lendo

A primeira greve de professores federais se deu em 1980 (ainda durante a ditadura) ... como eu disse: começou lá, não quer dizer que o impacto veio a ser sentido naquela época.

Abaixo uma matéria sobre as greves ... sugiro que cliquem no formato de impressão se estiverem usando o Chrome pois ficam umas propagandas na frente do texto. Simulem a impressão ou salvem de PDF.
http://ne10.uol.com.br/canal/educacao/noticia/2012/08/16/ha-32-anos-professores-federais-realizavamaprimeira-greve-361894.php

A primeira greve estadual que enfrentei foi em 1985 (no seu fim). Não que as greves retratem com precisão a queda no ensino, pois podem ser motivadas por questões políticas.

A educação pública na década de 60 não era para qualquer um, na primeira metade da década de 70 teve seu auge, na segunda metade começou a desafiar o militarismo, na década de 80 começam greves por melhor qualidade de ensino e reajuste de salários, na segunda metade da década de 80 se expande com perda da qualidade de ensino (a escola vira moeda política ... chega a muitos mas sem qualidade, como vemos hoje). De lá pra cá é só porrada.

A faculdade vira sinônimo de melhor qualificação e sonho de consumo, e de novo o ensino vira moeda através das cotas ... ao invés de alunos bem qualificados disputarem uma vaga nas universidades públicas o governo prefere introduzir alunos por outros critérios que não a qualificação.

Não acho justo um pobre negro não ter chance de ir pra faculdade, como não acho justo um branco de classe média (que também financia o ensino) ser punido por sua cor ou por ter uma vida mais ou menos ... todos tem que ter qualidade desde a base.... os ricos vão pros EUA, Europa e Japão.
..............
Um recado para os defensores do comunismo: o líder da Coreia do Norte se formou na Suíça ;-) continuar lendo

Sobre a pergunta "Meu avô é branco. Logo, eu sou branco. Estranhou?"
Não, eu não estranhei. Quase ninguém é 100% branco (albino), preto (negro). Somos misturados, e não é por sermos misturados que não somos todos iguais. Pelo contrário, a espécie humana prossegue com todas as suas cores.

Trabalhei como recenseador de 1999 a 2000 e na época recebíamos treinamento para jamais julgar/inferir a cor de uma pessoa apenas por olhar para ela. Havia uma pergunta sobre qual cor a pessoa se declarava. E aconteceu que me deparei com uma mulher (mãe). Fiz a pergunta sobre a cor dando para ela as possibilidades (branco, negro, mulato, amarelo...). Ela respondeu para mim perguntando: "ué filho que cor vc acha que tenho?". Por conta do treinamento, respondi com educação, que não poderia dizer isso, e que isso era algo que ela deveria falar. Ela riu e disse: "sou negra pode colocar ai".
Entendo a preocupação e o motivo das cotas"raciais", mas a cota racial não é a melhor solução. É um ajuste temporário devido a problemas históricos. A melhor cota e a mais justa é a por dados financeiros.
Contudo, como já citado, o fluxo do sistema de ensino precisa melhorar antes da faculdade (ensino fundamental e médio). Isso sim é o ideal que devemos almejar. continuar lendo

Parabéns, é de longe a mais inteligente inteligência sobre o tema. Que me perdoe a autora do artigo. Mas a sua fala põe o ponto final adequado à esta discussão. continuar lendo

Eu acredito que quem se utiliza de critério de cotas raciais, está se diminuindo. Sou favorável somente às cotas por nível financeiro. continuar lendo

No máximo, financeiro. continuar lendo

Sou leigo no assunto, mas não é constatado que geneticamente não há diferença significativa alguma? Que tipo de método de diferenciação se poderia usar sem cair inevitavelmente no "achismo" e que apenas serviria para fomentar o preconceito étnico-racial? continuar lendo

Fomentar o preconceito étnico-racial parece ser o objetivo. Dividir a sociedade.
(Como diziam os que se arvoravam em "lutadores contra a ditadura", com o punho esquerdo erguido: "a luta continua"). continuar lendo

O ministério público está correto, não é fenotipicamente que se verifica. Só falta alguém inventar algum exame de cabelo, nariz e cor de olhos para contradizer autodeclaração como branco, negro, índio, japonês etc etc continuar lendo